É um tanto quanto complicado e controverso falar de fundação de cidades, vilas e bairros. Em alguns poucos casos, mormente em se tratando de cidades, o fato fica facilitado quando inicialmente o povoado se desenvolveu ao redor de um sítio ou de uma fazenda. Em semelhante situação, a região toma o nome da fazenda e o proprietário é considerado seu fundador. Noutros casos, o que é muito comum, em certo lugarejo os moradores constroem uma pequena capela e, em torno dela, começa a surgir a cidade.
Em se tratando do Tatuapé, os fatos poderiam ter levado a esse mesmo resultado. Braz Cubas e Pedro Cubas, seu filho, no longínquo ano de 1560, chegaram à confluência do Ribeirão Tatuapé e do Rio Grande (Tietê) e lá, em terras de sua sesmaria, instalaram seu rancho com casas, currais e uma ermida devotada a Santo Antonio. Nele criaram gado bovino e suíno e desenvolveram inúmeras culturas, entre elas a uva. E por que motivo Braz Cubas não é considerado o fundador do Tatuapé? Cremos que pelo fato de não ter permanecido no local por muito tempo. Isso também tem explicação: ao serem beneficiados pela doação de terras, os sesmeiros, em contrapartida, tinham uma série de obrigações. Uma delas, a principal, defender as terras do soberano português, a qualquer momento e em qualquer parte do vasto território conquistado. Pois foi isso o que aconteceu com os Cubas, tiveram que abandonar o sítio em função dessas responsabilidades. Rodrigo Alvares e seu filho que a seguir se apossaram daquelas terras pouco depois as venderam.
Em 1611, em trecho inicial do inventário dos bens deixados por Lourenço Gomes Ruxaque lê-se:
… no termo desta villa adonde chamam Tatuapé na roça e fazenda que ficou de Lourenço Gomes… adonde foi Pedro Taques juiz dos órfãos… levando consigo a mim tabelião para fazer o inventário da fazenda que ficou por morte e fallecimento de Lourenço…
Pelo texto acima não cabe dúvida alguma que Lourenço Gomes Ruxaque era o proprietário da fazenda que ficava num lugar que chamavam Tatuapé e que nessas terras desenvolvia roça. Na seqüência do texto do inventário (não transcrito aqui) fica claro que esse homem possuía casas, vacas, cavalos, porcos, ferramentas e gentes de serviço (entre negros e índios: 29 pessoas). Pelo exposto, bem se vê que Lourenço Gomes Ruxaque poderia ter sido considerado o fundador da incipiente vila a que davam o nome de Tatuapé. E por que não o foi? Boa pergunta, que infelizmente não tem resposta. Lourenço era casado com Isabel Rodrigues e tinha três filhos: Pedro, Francisco e Catarina Gomes. Após seu falecimento, a viúva casa-se com Francisco Jorge, com este tendo outros três filhos: Maria Jorge, Antonia Gonçalves e Isabel Rodrigues. Antonia Gonçalves, testamenteira dos bens deixados por sua mãe, em face de problemas havidos entre ela e João Leite, seu primeiro marido, não pôde cumprir parte das obrigações, tendo sido confiscada mais da metade da herança. De uma ou de outra forma, o sítio que se localizava em terras do Tatuapé acabaram pertencendo ao ouvidor-Geral da Vara, que coincidentemente era o padre Matheus Nunes de Siqueira.
Pois bem! Dada a explicação acima o que interessa é, colocar os olhos sobre a figura desse famoso padre, considerado por historiadores, pesquisadores e leigos como sendo o fundador da região do Tatuapé. Isso motivado pela existência de uma petição feita por ele ao capitão-mor Agostinho de Figueiredo, datada de 5 de setembro de 1668. É o seguinte o texto dessa petição:
Diz o licenciado Matheus Nunes de Siqueira, morador na villa de S. Paulo, que elle supplicante tem uma fazenda com ermida e curral de gado légua e meia d´esta villa, na paragem chamada Tatuapé , terras que houve dos herdeiros do defunto Francisco Jorge, e por quanto não tem terras para lavrar e na testada d´estas para o Rio Grande (Tietê) em uma volta que faz o rio tem um pedaço de terra dentro do qual há algumas campinas, brejaes e restingas de matto que se pode lavrar, por isso pede a Vossa Mercê que, como procurador bastante do donatário, lhe faça mercê dar por carta de sesmaria a terra que pede para maior augmento da capella, havendo também respeito ser o supplicante filho e neto de povoadores e não ter a té agora carta de sesmaria, a qual terra correrá de umas campinas que partem da banda de Ribeirão de Tatuapé, correndo para o Rio Grande a riba pela volta que faz por uma campina que chamam Itacuritiba até uma aguada que foi do defunto João Leite. E.R.M.
Nota: O texto transcrito consta do livro Apontamentos Históricos, Geográficos, Bibliográficos, Estatísticos e Noticiosos da Província de S. Paulo – de Manuel Eufrásio de Azevedo Marques.
Deprende-se do texto exposto que o padre Matheus solicitava umas terras ermas, sem uso, que existiam entre a sua propriedade e o Rio Grande (Tietê). O padre Matheus era um homem influente nos negócios da Província. Como foi dito acima, na época da posse das terras do Tatuapé era ouvidor-geral, tendo mais tarde sido: visitador da Villa de São Paulo e de todas as mais parte sul desde o rio São Francisco té a ilha de São Sebastião inclusive, visitando todas as igrejas capellas e oratórios que forem da nossa jurisdição e das confrarias que achar nas ditas igrejas e outrossim tomara conta de todos os testamentos… Ao padre Matheus importava que lhe doassem essas terras para agregar às suas, visto ser homem de posses e dono de bom número de índios e serviçais. Parte desses índios, ele os aliciara anos antes em expedição que fizera pelos sertões. Esse contingente de homens poderia trabalhar aquelas terras, tornando-as produtivas. Ao que se sabe, ao chegar às terras tatuapeenses, a fazenda possuía diversas casas, mas não a Casa do Tatuapé como atualmente se conhece.
Em 1663, Maria de Siqueira e seu filho, padre Matheus, instituíram na Igreja Matriz de São Paulo a Capela do Senhor Jesus. Em 1673 foi lavrada uma escritura de doação referente a essa Capela:
* Maria de Siqueira doava a sua terça, o que lhe coubesse do monte e tudo o que herdasse de seu filho se este morresse primeiro, com a condição de que se rezasse uma missa cada semana por meu marido, por mim e pello dito meu filho. Determinava também que a administração da capela caberia, na falta de seu filho, ao parente mais chegado em linha reta, e, se possível, clérigo.
* O Licenciado Matheus Nunes de Siqueira doava à Capela do Senhor Jesus todos os seus bens móveis, e de raís avidos e por aver, q. por qualquer via lhe pertencerem para a administração da dita capella e aumento della…
Quanto à administração da Capela do Senhor Jesus, em testamento encontrado no Arquivo da Curia Metropolitana, diz o padre Matheus:… pertencia a administração della a meu irmão o P. Jacinto Nunes e elle se exzemiu sempre da tal administração dizendo tinha a sua Capella e se achava incapaz com pouca saude e estarem as fazendas destantes…
Todos os dados expostos até este ponto comprovam de maneira cabal haver duas capelas, uma na Penha e outra no Tatuapé, esta denominada Capella do Senhor Jesus. Aquela administrada pelo padre Jacinto; esta pelo padre Matheus.
Matheus era filho de Aleixo Jorge e de Maria de Siqueira Nunes. Era primo legítimo de Francisco Jorge, que como já foi dito casara-se com a viúva de Lourenço Ruxaque. Matheus tinha sete irmãs e dois irmãos: Antonio Jorge e padre Jacinto Nunes de Siqueira. Presumivelmente faleceu entre 1681 e 1682, pois um documento encontrado no Arquivo da Curia Metropolitana, datado de 6 de outubro de 1682, informa que o padre Jacinto era seu testamenteiro e andara lidando com seus papéis, inventário e legados.
Quanto à Casa do Tatuapé, tudo leva a crer tenha sido construída entre 1668 e 1698 pelo administrador da fazenda, Mathias Rodrigues da Silva. O padre Matheus o nomeara administrador de seus bens em testamento. Era casado com Catharina D´Orta, sobrinha e afilhada do padre e filha de uma de suas irmãs: Sebastiana da Rocha. No inventário de 1698 dos bens de Catharina consta pela primeira vez a descrição de casa de taipa de pilão de três lanços e coberta de telhas. Embora esta edificação possua características do período dos bandeirantes, como a construção em taipa de pilão e a arquitetura em três lances, a Casa do Tatuapé apresenta a peculiaridade do telhado em duas águas.
Elias Quartim de Albuquerque foi o último morador da Casa do Tatuapé. Era um dos filhos de Antonia Maria Quartim, sobrinha de Luiza Eufrosina Quartim, Baronesa da Silva Gameiro, que fora proprietária do sítio e portanto da famosa casa nele existente. Elias permaneceu nela juntamente com seus parentes de 1877 até 1943, ano em que faleceu. De 1943 até 1951 a casa pertenceu à Tecelagem Textília, ocasião em que foi tombada pelo Sphan. Somente em 1979 o governo do município faria a expropriação do imóvel, sendo restaurado e entregue ao público para visitação em 1981. Atualmente faz parte do acervo de Casas Históricas, sob a responsabilidade do Patrimônio Histórico do Município.
Eu acho, que se desde 1551 Brás Cubas já fazia vinho das uvas colhidas no Tatuapé, como sua fundação só foi em 1560, acho que tem algum erro ai e por que não dar o crédito a quem as plantou se procurarem na História vão ver que Brás Cubas era Governador na época e trouxe as videiras da Europa ou elas nasceram sozinhas se são originárias de la, acho que História deve ser contada correta e nao meia História e se fazer justiça com relação ao nome do Fundador do Bairro.