Em 9 de março de 1854 nascia em Castellabate (Castelo do Abade), sul da Itália, Francesco Matarazzo. Com 18 anos morre-lhe o pai. Por ser o filho mais velho teve que se dedicar à liderança e sustento da família. Esse fato impediu-lhe qualquer possibilidade de ir além do estudo fundamental.
Em 1881, com 27 anos, desembarcou no porto do Rio de Janeiro. Mandara vir da Itália uma tonelada de banha de porco que pretendia comercializar no Brasil. Para sua infelicidade, o barco que trazia o produto afundou antes de aportar em terras brasileiras. Sem dinheiro e sem perspectivas, não lhe restou outra alternativa senão viajar para Sorocaba, em São Paulo, à procura de um conterrâneo: Fernando Gradino.
Ajudado por este e por outros amigos, conseguiu alguns recursos e montou uma modesta mercearia. Em pouco tempo se evidenciava seu arguto senso de negociante. Rapidamente as prateleiras do seu estabelecimento abarrotaram-se com centenas de produtos nacionais e importados. Se algum cliente procurasse algum item que porventura faltasse na sua venda, imediatamente providenciava sua compra.
Logo se deu conta de que justamente o produto que trouxera da Itália e perdera antes do desembarque era o mais solicitado: banha de porco. Ciente disso, passou a comprar porcos na região e a fabricar a banha nos fundos da sua mercearia. No início, entregava o produto em barris, que após de esvaziados lhe eram devolvidos.
Na seqüência, daria com a solução que mudaria os rumos de sua vida, o acondicionamento da banha em lata. Esse procedimento garantiu-lhe a venda em larga escala. Em pouco tempo sua situação melhorou a tal ponto que lhe permitiu financiar a vinda de Filômena, sua esposa, dos filhos e de três irmãos: Giusepe, Luigi e Andrea.
Em determinada época faltou farinha de trigo no Brasil. Matarazzo pôs-se a campo em busca de financiamento para construir um moinho em São Paulo. O London and Brazilian Bank acreditou nele e lhe concedeu o empréstimo. O resultado do acerto desse investimento foi uma radical mudança de estágio, de pequeno empreendedor passava agora a grande empresário. Por volta de 1887 já podia vangloriar-se de faturar 20 contos de réis, e treze anos mais tarde, 2.000 mil contos.
Por volta de 1920 suas fábricas já produziam: banha, farinha de trigo, sabão, tecidos, inseticidas, perfumes, adubos, bebidas, pregos, velas e uma infinidade de outros produtos. As Indústrias Reunidas Francisco Matarazzo – IRFM – passaram a ter subsidiárias em cidades de outros Estados: João Pessoa, Santos, Curitiba e Rio de Janeiro. Nesse tempo seu grupo passou a contabilizar o quarto maior faturamento do País. À sua frente apenas a União Federal, o Departamento Nacional do Café e o Estado de São Paulo.
Não obstante sua imensa riqueza, Matarazzo continuava um industrial à moda antiga, entrava em seu escritório às 7 horas e dificilmente saía antes das 21 horas. Era um homem austero e de costumes rígidos para com seus treze filhos, um patriarca na verdadeira acepção da palavra. Em 1928, fundou o Centro das Indústrias do Estado de São Paulo – CIESP –, tendo sido eleito seu primeiro presidente. Recebeu o título de Conde ao ajudar a Itália por ocasião da Primeira Guerra Mundial.
Nessa época chegou a morar durante certo tempo em seu país de origem. No apogeu de sua trajetória, seu grupo empresarial chegou a somar 365 fábricas e um contingente de 15 mil funcionários. Após sua morte, que se deu em 10 de dezembro de 1937, graves divergências entre seus herdeiros e a imperfeita análise das mudanças havidas na área industrial do País impediram a manutenção do patrimônio deixado pelo patriarca. A forte concorrência dos anos 50, enfatizada principalmente na alta especialização dos mais variados setores, levaram à falência a maior parte de suas fábricas.
Relatamos nas linhas acima um resumo da vida do extraordinário personagem que foi Francesco Matarazzo. Mas, para nós tatuapeenses, interessa-nos principalmente o fato referente à compra feita por ele do sítio Piqueri em 1927. Este sítio era o remanescente da maravilhosa área verde que um dia pertencera ao desbravador Braz Cubas e ao empreendedor Matheus Nunes de Siqueira. Por essa época, entre a velha casa do padre Matheus e o trecho do Piqueri, as terras já haviam sido desmembradas em inúmeros lotes, que pertenciam a várias famílias.
No entanto, o sítio comprado pelo Conde ainda continha exuberante flora, nele pontificando esplêndidas árvores centenárias. A propriedade chegava até as margens do Tietê, paraíso dos chorões e de outras espécies de árvores ribeirinhas. Simultaneamente a aquisição do sítio, Matarazzo comprou também a olaria de Genaro Perfetto, localizada nas imediações. Naqueles dias de precários meios de transporte, o rio Tietê representava excelente escoadouro para a produção, tanto dos produtos da chácara como dos produtos provenientes da olaria.
Para manter viçosa a flora e os diversos trechos gramados, foi instalado um moderno sistema de irrigação. Próximo da magnífica mansão assobradada, construída especialmente para ser a sede do sítio, um lago artificial acolhia grande quantidade de gansos e patos. Desenvolveu-se um pasto especial para alimentar a seleta criação de animais: cavalos argentinos, búfalos americanos, pôneis e vacas. Um grande tanque de água foi instalado para submetê-los à rigorosa limpeza.
Além da flora silvestre, a chácara mantinha nas diversas áreas uma infinidade de árvores frutíferas, até algumas plantas mais raras como o araçazeiro e a castanheira européia. Também foram construídas enormes cocheiras para abrigo dos animais de tração, estes utilizados para o transporte dos produtos das fábricas do Conde. Durante anos a fio, dois homens foram responsáveis pela administração da chácara: José Sani, brasileiro e Carpinelli, imigrante italiano.
Matarazzo recebeu em sua chácara do Piqueri as mais altas autoridades do cenário político, social e empresarial do Estado e do País. A elite paulistana participou das inúmeras festas realizadas em tardes ensolaradas nos bosques da esplêndida propriedade em comemoração aos mais variados eventos.
Em 1971, as autoridades municipais procederam a desapropriação das terras. Ainda mantendo grande parte da beleza antiga, à histórica chácara foi entregue sete anos depois à população com o nome de Parque do Piqueri. A esplêndida morada do Conde foi demolida por ocasião da desapropriação, em contrapartida, manteve-se intacta a antiga casa térrea dos caseiros, que atualmente é ocupada pelo administrador do parque.