POR CAROLINE BORGES
Vladimir Brichta estava com seus planos profissionais bem estruturados para os próximos meses. Após tantos anos dedicado às novelas, o ator estava arquitetando uma folga dos folhetins para focar em outros trabalhos. A produção do remake de “Renascer”, obra clássica de Benedito Ruy Barbosa que foi exibida em 1993, mudou radicalmente a ordem de prioridades de Vladimir. Convidado para viver o asqueroso Coronel Egídio, o ator retornou aos Estúdios Globo com um forte apetite artístico e uma nostalgia na bagagem. “Não estava nos meus planos fazer novela por agora. Mas quando soube que fariam ‘Renascer’ de novo… Eu estava no teatro em 1993 quando a novela estava no ar e me impactou de forma gigantesca”, rememora.
Na obra adaptada por Bruno Luperi, Egídio é filho único e herdeiro do pai, Coronel Firmino, de Enrique Diaz. Ele se fez um Coronel temido e influente na região. Casado com Dona Patroa, de Camila Morgado, Egídio herdou também do pai a rivalidade com José Inocêncio, vivido por Marcos Palmeira. Inimigo declarado do homem que o pai no passado mandou depelar vivo, o fazendeiro é uma espécie de atravessador que vive da compra e venda do cacau de produtores da região. “Ele é perverso, explora mão de obra. Um cara execrável. Adoro o personagem, mas não daria bom dia a ele. Representa um Brasil antigo”, afirma.
P – Após “Quanto Mais Vida, Melhor”, você enveredou sua carreira para projetos mais curtos e outras produções no streaming. Como surgiu seu nome no elenco de “Renascer?”
R – Não imaginei que fosse fazer novela tão cedo, não estava nos meus planos mesmo. Fui fazer outras coisas no ano passando. Tinha um filme para fazer. Então, começaram a me sondar para “Renascer”. No início, seria um papel na primeira fase da trama. Mas aí falaram sobre a segunda fase e veio o Egídio. Acho um personagem interessante. É totalmente amoral.
P – A primeira versão da novela foi ao ar em 1993. Qual a sua ligação com o universo de Benedito Ruy Barbosa antes de integrar o elenco do remake?
R – Eu estava no teatro em 1993 quando a novela estava no ar e me impactou de forma gigantesca. Estava me tornando profissional no teatro. Por isso fiquei muito feliz de poder contar essa nova versão da trama. Acho que o certo era fazer essa novela. É uma das três novelas mais importantes da minha vida. Quando ia rolar “Segundo Sol”, eu fiquei doido para fazer. Em “Renascer”, tive essa mesma sensação. A verdade é que, toda vez que a Globo faz uma novela na Bahia, eu acho que tenho de estar ou a Globo tem de me botar (risos).
P – Como assim?
R – Sou de Salvador, né? Eu conheço esse indivíduo, conheço esse ambiente. Acho que tudo isso me dá muito mais naturalidade em cena. Sinto uma proximidade muito forte com todo esse ambiente que a novela retrata.
P – Na primeira versão, o personagem se chamava Teodoro e foi interpretado por Herson Capri. Você chegou a conversar com o ator sobre a nova versão da novela?
R – Sim. Falei com ele como estava honrado de assumir esse papel. Ele me deu a benção dele e isso já me beneficiou demais. O Herson foi muito elegante e gentil. Me senti abençoado para começar essa jornada.
P – De que forma você enxerga as vilanias do Egídio dentro do enredo?
R – Eu discordo um pouco dessa classificação de vilão. Não sou muito de martelar no vilão. Ele é perverso, explora mão de obra. Um cara execrável. Adoro o personagem, mas não daria bom dia a ele. Representa um Brasil antigo, arcaico.
P – Na sua visão, quais situações moldam essa personalidade perversa do Egídio?
R – Ele assedia moral e sexualmente a esposa e a funcionária. Ele explora a mão de obra dele naquele tipo de relação que é análoga à escravidão. Ele é um cara horrível e indefensável. Tenho prazer com o meu trabalho, então tenho um distanciamento do personagem. Cada vez uma tensão maior e uma atenção maior para não soar leviano. Para que as pessoas possam assistir e se comover com aquilo e levar um pouco para vida essa discussão. A ideia é que isso se repita cada vez menos.
P – A Adriana Esteves, sua esposa, também esteve na primeira versão, em que viveu a protagonista Mariana. Vocês chegaram a conversar sobre o projeto?
R – Assim que as chamadas começaram a sair, a gente via juntos. É claro que há uma curiosidade, mas ela não dá pitaco não. Todo começo de trabalho, a gente se ajuda um pouquinho para decorar. Vira e mexe, ela me ajuda um pouquinho. Ela não leu nada da Mariana porque eu não tinha cena com ela. Ela leu as cenas da Dona Patroa e da Joaninha.
“Renascer” – Globo – Segunda a sábado, às 21h30.
Visual garantido
Para “Renascer”, Vladimir Brichta não quis ousar no visual do Coronel Egídio. O ator chegou em cena com barba e cabelos curtos. “É quase um visual meu mesmo. Ele é um homem que quer ser coronel. Então, ele cria essa imagem de coronel para ele mesmo. A barba, por exemplo, é algo muito característico da mítica do coronel”, explica.
O ator, inclusive, não está se pautando na caracterização para moldar o desprezível coronel. Vladimir tem focado no texto de Bruno Luperi. “Não estou fazendo mais nada. Meu foco é estudar a novela. Todas as informações que preciso estão por ali”, aponta.
Repulsa geral
Um dos pontos mais pesados da história de Egídio é o assédio que ele comete contra Joana, papel de Alice Carvalho. O fazendeiro fica obcecado pela funcionária, a ponto de surrupiar e cheirar as roupas dela. Com isso, a novela abre espaço para discutir o assédio dentro do ambiente de trabalho e em níveis de hierarquia diferentes. “A gente discute assédio na dramaturgia há tempos. Até em Shakespeare já tinha assédio. Hoje em dia, porém, esses temas estão cada vez mais caros. Essa situação é tão dramática, tão trágica, que a gente coloca também alguns alívios cômicos. É aquele lugar onde o trágico e o patético se encontram”, ressalta.
Instantâneas
# Antes de “Renascer”, Vladimir gravou o melodrama “Pedaço de Mim”, original Netflix. A produção, que também contará com Juliana Paes no elenco, ainda não tem data de estreia prevista.
# No final do ano passado, o ator integrou o time de debatedores fixos do “Papo de Segunda”, do GNT.
# Desde 2006, o ator é casado com a atriz Adriana Esteves.
# Por conta de compromissos profissionais do pai, Vladimir chegou a morar um período na Alemanha.