Sr. redator:
“O Tietê é o mais extenso rio do Estado de São Paulo. Nasce na serra do mar, no Município de Salesópolis, e após atravessar a cidade de São Paulo, corre na direção de Sudeste para Noroeste, cortando o centro do Estado, numa extensão de 1.032 km e formando uma bacia hidrográfica de 71.000 km2.
Banha ainda as cidades de Salto, Porto Feliz, Tietê e Barra Bonita. Deságua no rio Paraná, a 12 km a jusante do antigo salto de Urubupungá, hoje submerso pela represa de Jupiá (usina Sousa Dias).
O Tietê, até 1967, tinha apenas 400 km contínuos de franca navegabilidade. Para ligá-los aos 600 km do alto Paraná foi necessária a canalização de 230 km e a construção de várias barragens (aproveitadas para a instalação de usinas hidrelétricas) com eclusas.
REGULARIZAÇÃO
O plano de regularização de seu curso criou uma via navegável desde Itu, a 160 km da cidade de São Paulo, até Itaipu, no Paraná, e em direção a montante, até o Triângulo Mineiro. Entre as usinas hidrelétricas construídas ao longo do Tietê destacam-se as de Barra Bonita, Álvaro de Sousa Lima (Bariri), Ibitinga, Mário Lopes Leão (Promissão) e Nova Avanhandava.
A hidrovia Tietê-Paraná é o maior conjunto de obras do gênero, para a navegação fluvial em cerca de 5.000 km dos rios Tietê e Paraná (SP-MS).
RIO DOS BANDEIRANTES
Chamado pelos índios de Anhembi, o rio teve grande importância histórica como via de penetração e do povoamento do sertão, ao servir de caminho para os Bandeirantes com suas “entradas” e “bandeiras” nos séculos XVI e XVII. Suas águas apresentam atualmente vários trechos com sérios problemas de poluição, especialmente na região de São Paulo.
LAZER DOS PAULISTANOS
O rio Tietê é o maior manancial que abastece o nosso Estado, percorrendo os mais distantes recantos e cidades que ele banha rumo ao interior.
Vamos falar da importância deste rio e sua função social na cidade de São Paulo até 1950. Era comum as pessoas utilizarem os recursos do rio das mais variadas formas. Desde a coleta de água potável que abastecia a capital, até o mais simples lazer: natação, pesca, regata e piquenique.
Na nossa infância na Vila Maria, o banho no rio era “sagrado”, depois de uma “pelada” de futebol. As mulheres da Rua Antonio Fonseca e adjacências lavavam roupa no rio, pois as casas ainda não tinham água canalizada. Algumas dessas mulheres faziam desta atividade um meio de complementação da renda familiar.
REGATAS
Todos os clubes que margeavam o Tietê praticavam suas regatas no rio: Penhense, Sport Clube Corinthians Paulista, São Paulo Futebol Clube, Espéria e Clube de Regatas Tietê. Era comum, aos sábados e domingo (no verão), quando estávamos pescando, ver passar uma Regata, Sandolim ou até mesmo os Batelões, singrando as águas do Tietê. Os Batelões transportavam areia de um “Porto” ao outro (Cangaíba – Vila Guilherme).
A travessia de São Paulo a “nado” era promovida no rio Tietê. Os competidores saíam da Ponte da Vila Maria e nadavam rio abaixo até a Ponte das Bandeiras, onde era a chegada. Além disso, o Clube de Regatas Tietê e o Espéria promoviam “Campeonatos de Pesca” no mesmo local.
Por volta de 1940, parte da classe média alta que ainda residia no bairro dos Campos Elísios fazia piquenique aos domingos na Ponte das Bandeiras e proximidades, onde pescavam, nadavam e passavam o dia com seus familiares. As “madames” aproveitavam para exibir o seu “maiô” comprado nas “Lojas do Mappin”, o qual era a última “moda”.
COMEÇO DA POLUIÇÃO
Com a crise econômica de 1929 e a queda da “economia cafeeira”, os Barões do Café resolveram investir os seus recursos ganhos na agricultura, em outro ramo de atividade: na indústria em São Paulo.
Entretanto, esta “industrialização” só foi possível depois que o governo federal criou uma infraestrutura, isto é, indústrias de base: Companhia Siderúrgica Nacional (Aço), Eletrobrás (Energia), Petrobrás (Combustível), Petroquímica e Química Fina; Papel, Papelão e Celulose. O processo de industrialização ocorreu timidamente neste período, só acontecendo de fato a partir de 1950 do século passado.
A partir de 1940 houve grande movimento migratório no Estado de São Paulo, partindo do interior rumo à capital. Eram pessoas que perdiam seus empregos na lavoura e vinham buscar novas oportunidades nos grandes centros urbanos. Na década seguinte (1950) este movimento migratório cresceu de maneira exacerbada. Agora eram os irmãos nordestinos que fugiam da seca nos seus Estados, buscando mais sorte na cidade de São Paulo.
Em 1949, foi inaugurada a Nitroquímica em São Miguel Paulista. Esta indústria de vez em quando lançava sua “descarga química” no rio Tietê. Era um verdadeiro horror. Centenas de milhares de peixes mortos desciam o rio boiando. E foi aí que começou a poluição do rio Tietê, sem que nossas autoridades tomassem providências contra essa agressão à natureza.
INDUSTRIALIZAÇÃO E DESENVOLVIMENTO
No começo dos anos 50 houve um crescimento acelerado e um processo de urbanização na cidade de São Paulo, fruto de sua industrialização.
A construção civil sempre foi o “motor” da economia e na época o grande polo que absorvia mão-de-obra não qualificada. Os migrantes que perdiam seus empregos no campo, e vinham para a capital, eram praticamente absorvidos por este setor.
Nossa cidade virou um verdadeiro “canteiro de obras”. Houve uma expansão de vários segmentos industriais e um incremento no comércio atacadista e varejista, inclusive os bancos, escritórios e prédios públicos.
Além disso, houve uma explosão demográfica na cidade de São Paulo, originada pela prosperidade econômica e o “êxodo rural”. E esta “massa populacional” necessitava de moradia. Observa-se, um grande crescimento na construção de casas populares, formando os “cortiços” nos bairros próximos ao centro da cidade, e iniciando a formação da maioria dos bairros da periferia de São Paulo.
É aqui que começou o descaso das autoridades e da sociedade com relação à poluição do rio Tietê. As autoridades por permitirem que por mais de 20 anos as empresas lançassem seus detritos e dejetos industriais no leito do rio. Tinham o mesmo destino os esgotos familiares, que também eram lançados no rio sem nenhum tipo de tratamento.
A sociedade teve sua parcela de culpa, por lançar no rio todo o tipo de detrito: sapato, colchão, sofá, pneus, plásticos, móveis e até carcaça de carro. Foi inadmissível! O Tietê não suportou tanto desmando, agonizou e hoje é um rio sem vida.
DESPOLUIÇÃO
Quem sabe num futuro próximo, possa surgir um governador “iluminado”, que faça a despoluição de fato do rio Tietê, devolvendo-lhe sua “vida primitiva” de grande manancial. E aí, então, podemos ter o rio Tietê navegável dentro da grande São Paulo, desde o bairro da Penha até o bairro do Piquiri. Seria mais uma via de transporte urbano e a sociedade paulistana agradeceria.
Conclusão: somos gratos ao Tietê pela nossa infância na Vila Maria, onde praticamos o lazer e assistimos o esporte aquático florescer em suas águas limpas e cheias de vida. (função social)
Agradecemos também, à construção das hidrelétricas ao longo do seu curso, gerando energia para atender o consumo das famílias e das empresas. Além disso, ao transporte de grãos e a produção da agricultura familiar, pela navegação fluvial do complexo Tietê-Paraná. (função econômica)
Em tempos idos, foste o “Portal dos Bandeirantes” com suas “entradas” e “bandeiras”, desbravando sertões, povoando o interior e alargando a fronteira do nosso Estado. (função política)
Obrigado, Tietê! Fizestes a tua parte! Cumpristes com as três funções básicas para o desenvolvimento do ser humano, que nem sempre retribui na mesma moeda.
Por outro lado, te pedimos desculpas pela sociedade paulistana, que utilizou os seus recursos sem o mínimo de “sustentabilidade”, causando um dano terrível ao meio ambiente. Em nome do desenvolvimento e do progresso, a cidade de São Paulo teve um altíssimo custo, e o rio Tietê pagou com a própria vida. Agora, nós da Vila Maria, em nome da nossa infância, prestamos esta homenagem a este patrimônio histórico.”
José Maria Costa (Gica)

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