Sr. redator:
“Os critérios de aumento recentemente anunciados e propostos em projeto de lei, do IPTU na cidade de São Paulo, por meio de novos critérios para o cálculo do valor venal e para a revisão da planta genérica de valores, da forma como proposto, tende a ter um efeito confiscatório, proibido pela Constituição Federal, na medida em que um aumento abrupto e desmedido, de um exercício (ano) para o outro, avança sobre a renda do contribuinte do IPTU, já onerada, evidentemente, pelo respectivo imposto.
Isso ocorre porque a base de cálculo do IPTU é o valor venal, que, juridicamente, corresponderia ao valor de mercado do imóvel. Entretanto, se nos últimos anos os imóveis da capital paulista em geral se valorizaram acima ou muito acima da inflação, não é menos certo que o valor de mercado de imóvel representa apenas uma reserva de patrimônio econômico, tendo em vista uma mera expectativa para futura venda do bem — se é que o proprietário desejará vender o bem.
Essa valorização, por si só, nada acrescentou em dinheiro (financeiramente) à renda do contribuinte naquele exercício. Tal descrição remete à distinção básica entre os conceitos de econômico e financeiro.
Hipoteticamente, uma pessoa pode muito bem ter valorização de 40% de seu imóvel em cinco anos e o respectivo IPTU, da forma como proposto, onerar mais fortemente seu orçamento doméstico. Essa situação faz as vezes do aumento de um verdadeiro imposto de renda municipal, pois as fontes de renda do contribuinte que suportarão esse aumento (salários, rendimentos como autônomo, lucros, juros, e mesmo aluguéis, ainda que oriundos desse mesmo imóvel). Se subirem, ou será abaixo da inflação, ou, se acima dela, não será muito.
Trocando em miúdos: valorização de imóvel não significa dinheiro vivo a mais em caixa, fato que convém ao poder público ignorar, a não ser que esteja ocorrendo uma venda e compra do imóvel, fato que já é tributado pelo ITBI, tendo, aí sim, relação mais apropriada com o valor venal do bem.
Tanto isso é certo que a legislação municipal de São Paulo reconhece a coexistência de dois valores venais para determinado imóvel: um para o IPTU e outro para o ITBI, sendo este último maior. Daí o efeito confiscatório, notadamente se o aumento é abrupto e desmedido, de um exercício para o outro, violando os princípios constitucionais da proporcionalidade, razoabilidade e capacidade contributiva.
As recentes manifestações de junho, que conduziram ao congelamento da tarifa de ônibus, e a suposta necessidade de maiores subsídios municipais, foram o pretexto perfeito da chamada ‘justiça social’ – rótulo que a tudo se presta – para que mais esse abuso fosse proposto de forma tão ágil pela atual gestão.
O Supremo Tribunal Federal, no passado, já teve oportunidade de reconhecer que o efeito confiscatório não se refere a um tributo isoladamente, mas à carga tributária, ainda que referente a cada ente federativo (União, Estados federados ou Distrito Federal e Municípios), e não à carga total devida às três esferas de governo, como ocorre no mundo real. Portanto, estejamos atentos aos fatos e às contestações judiciais que virão, caso seja aprovado um aumento nesse nível.”
Sandra C. M. Vasconcelos
