Algumas mudanças são muito bem-vindas. Para Eriberto Leão, o intervalo de quase uma década entre as tramas de “Êta Mundo Bom” e “Êta Mundo Melhor” faz parte essencial do trabalho de composição do vilão Ernesto. Cerca de 10 anos depois, o personagem criado por Walcyr Carrasco em 2016 não traz apenas as evoluções de roteiro, mas também as marcas do tempo em seu intérprete. “A gente está muito feliz. Não é exatamente uma continuação, mas a gente conseguiu ‘linkar’ tudo. Voltar a fazer um personagem, após nove anos, é algo inédito para mim e um desafio, pois a gente muda em nove anos. É o mesmo Ernesto, mas tenho uma desculpa para alguma mudança sutil porque ele quase morreu”, justifica.
Na história das seis, Ernesto é o grande responsável pelo sequestro do filho de Candinho, papel de Sergio Guizé. O vilão tenta, de todas as maneiras, se dar bem às custas da criança. Ao longo dos capítulos, ele ganhou novos comparsas. Se envolve com Tamires, de Monique Alfradique, e segue comparsa de Sandra, vivida por Flávia Alessandra, por quem é apaixonado. “Talvez o Ernesto esteja um pouco mais vilão, estou sentindo isso. Mais ambicioso ainda porque não tem mais nada a perder. O DNA é o mesmo e os companheiros mudaram um pouco porque ele é primo da Zulma. A Sandra é o grande amor do Ernesto, mas não daria a vida por ela (risos)”, aponta.
P – Após quase uma década, como você enxerga a oportunidade de revisitar um personagem como Ernesto?
R – É uma experiência rara e profundamente gratificante. A continuidade de uma novela é algo quase mítico no nosso meio e poder reviver o Ernesto é como reencontrar uma parte de mim que ficou guardada. É um presente que me emociona, porque não é só sobre voltar a atuar, mas sobre mergulhar novamente em uma história que tocou tantas pessoas. Me sinto honrado e muito feliz.
P – O Ernesto retorna mais sombrio no enredo de “Êta Mundo Melhor”. Quais foram os caminhos que você percorreu para aprofundar essa transformação na composição do personagem?
R – Ele passou por uma experiência de quase morte e isso o transforma, mas não necessariamente para melhor. Ele volta repetindo erros, cometendo novos crimes, errando como ser humano. A vilania dele se aprofunda, se torna mais complexa. Em “Êta Mundo Bom”, ele já era um vilão, mas agora há uma densidade maior, uma verticalidade emocional que vem, por exemplo, do sequestro da Estela. Ele acredita que ela está morta, e nem ele sabe ao certo se causou isso. Essa ambiguidade é poderosa.
P – Nos últimos anos, você tem encarado uma série de vilões. Como tem sido mergulhar nesse processo de vilania em sequência?
R – Tenho sido convocado para explorar esses lados mais sombrios e isso exige uma entrega emocional intensa. Eu me preparo buscando compreender minhas próprias sombras. Todos nós temos pulsões, temos escolhas. Então eu me pergunto: quais são as escolhas do Ernesto? Quais foram as minhas? Onde, dentro da minha alma, existe algo que possa dialogar com ele? É um mergulho que vai do mais sublime ao mais tenebroso.
P – Como assim?
R – O Ernesto vem mais maduro e isso é consequência tanto da evolução da história quanto do meu próprio processo pessoal. A trama tem uma qualidade absoluta – na escrita, na direção, no elenco – e isso permite que o personagem se firme como um clássico. Há muitas camadas novas e elas não são artificiais: são fruto de uma construção cuidadosa e orgânica.
P – Logo no início dos trabalhos de “Êta Mundo Melhor”, você estava em “Mania de Você”. Como funcionou essa logística entre as produções?
R – Foi algo raro eu emendar novelas dessa forma. A última vez, inclusive, aconteceu quando emendei “Malhação” e “Êta Mundo Bom”. Mas não foi tão seguido naquela época. Dessa vez foi diferente porque eu emendei mesmo. Não tive um dia de férias. Terminei uma produção e, no dia seguinte, estava com a chave virada para a próxima.
P – Assim como boa parte dos profissionais, você também mantém um novo vínculo por obra com a Globo. Como tem sido encarar essa nova organização do mercado?
R – Tudo caminha para a evolução, mesmo quando parece confuso. É como uma lei que começou no Big Bang e segue seu curso. Pude fazer projetos que talvez não tivesse feito se estivesse como elenco fixo da Globo. Ao mesmo tempo, emendei duas novelas – algo muito raro. Não tive nem um dia de férias. Foi intenso, mas também muito especial. Tem sido um período muito rico.

